Pedem-me um testemunho. Não me vem à cabeça nenhum grande feito. Percorro as imagens da minha memória e as mais marcantes são pessoas, atitudes, gestos de verdade pura e cristalina.
A Mãe da Francisca, cozinheira do projecto Aventura Solidária, no Nordeste Brasileiro, encostando a cabeça ao meu ombro, feliz por me rever numa das várias viagens até ao nosso projecto em Milagres.
Ou a minha “irmã” Archita, na Índia, que revi quase 30 anos depois de uma curta estadia no Norte de Calcutá, era ela própria voluntária numa aldeia remota da organização que apoiávamos à época.
Ou ainda, o olhar do escravo que cruzei numa aldeia escrava nos arredores de Niamey, no Níger onde fomos escoltados por militares. Pediram-nos uma Escola, como projecto prioritário, mais importante do que um poço de água ou um posto de saúde.
Mas talvez por se tratar de um país diferente de todos, com gentes tão especiais, recordo agora Madagáscar, com os seus arrozais, a arquitectura tão peculiar, os rostos redondos tão diferentes de qualquer parte do Mundo.
Íamos visitar aldeias remotas cobertas pela clínica móvel do projeto do nosso parceiro. O motorista só devia estar habituado a guiar em estradas alcatroadas. Revelou não ter a mínima experiência em “picadas”. E claro, ficámos atascados…
Valeu-nos a experiência de Fernando Nobre que lhe foi dando indicações para sairmos da lama e seguir caminho.
Seguimos viagem, mas o céu foi ficando cada vez mais carregado, ameaçando chuva. Embora sem dizer palavra, começámos a ficar preocupados já que teríamos que regressar pelo mesmo caminho. Mesmo assim cumprimos o nosso objectivo.
O regresso foi em silêncio, cansados e apreensivos com o que nos esperaria adiante.
Mas qual não foi o nosso espanto, no caminho de volta, ao encontrar um bando de crianças muito jovens que, por iniciativa própria e porque tinham assistido ao nosso percalço, resolveu arranjar a estrada o melhor que pôde. E que felizes estavam!
Passámos ligeiros sem qualquer contratempo.
A isto sim chamo solidariedade e cuidado com o outro.